O curso que ora apresentamos ambiciona
preparar a igreja para a prática do evangelismo bíblico que leve em
consideração o contexto cultural/social em que o ouvinte do evangelho esteja
inserido.
Para tanto, estaremos utilizando a passagem
do Evangelho de João, capítulo 4, como texto base para nossas aulas. Sendo
assim, nossa oração é para que ao término deste curso, a igreja esteja
preparada para comunicar o evangelho de maneira pertinente e significativa, vivendo
o Reino de Deus conforme o evangelho de Cristo.
JESUS E O PROBLEMA
SAMARITANO
1ª
Parte
Entendendo o Contexto
1 –
O Evangelho é para todos?
2 –
Porque escolher como base João capítulo 4?
Escolhemos o texto de João 4, por causa da premissa - que
todas as culturas anseiam pela Palavra – ensinada através dele por Jesus.
Ora, mesmo
o Senhor desenvolvendo um poderoso ministério
na Judéia, (pois fazia e batizava mais discípulos
que João 4.1), nos diz o relato que ele retornou
mais uma vez
para Galiléia. É nesta viagem
de volta que
começa o trabalhar
de Jesus para , a princípio ,
nos ensinar a
dimensão de nossa
“Paróquia ”,
e em seguida ,
arrancar de nós
todo e qualquer
tipo de “reserva cultural” que
nos impeça de comunicar
o evangelho . Uma vez
que , “a missão de Jesus não se reduziu a cruzar barreiras geográficas. Jesus também
atravessou barreiras sociais , incluindo alguns
segmentos da sociedade
antes negligenciados” (Carriker
2005).
Isto fica bastante claro quando analisamos o
texto escolhido, pois, como é do conhecimento de todos, os judeus odiavam
poderosamente os samaritanos e estes, os judeus. Jesus insistiu em viajar
justamente por entre os assais inimigos de seu povo para que, através desta
viajem, os mesmos compreendessem que Jesus é Rei sobre todos os povos[1] e,
que mesmo para os samaritanos agora tão odiados, havia a possibilidade de
salvação propiciada pelo Evangelho.
3 –
De onde vem o ódio dos judeus pelos
samaritanos?
Diz o texto
do evangelho citado que
era necessário ,
para se viajar da Judéia para Galiléia, atravessar a província de Samaria. Ora ,
judeus e samaritanos
se odiavam, num cisma que grassava as duas províncias
desde a época
da “caldeação” de um povo misto trazido pelos
assírios com
o que restou das Dez
Tribos do Norte
ao final da investida
Assíria com
Sargão II, que culminou com o desaparecimento
das Tribos do Norte
(721 a.C). Este fato
histórico ficou muito
bem fundamentado
no trecho de II Reis
17.24-41, vejamos:
O rei da Assíria trouxe gente
de Babilônia, de Cuta, de Ava , de Hamate
e de Sefarvaim e a fez habitar nas cidades de Samaria, em
lugar dos filhos
de Israel; tomaram posse de Samaria e
habitaram nas suas cidades .
A princípio , quando
passaram a habitar ali ,
não temeram o Senhor ;
então , mandou o Senhor
para o meio
deles leões , os quais
mataram a alguns do povo .
Pelo que se
disse ao rei da Assíria :
As gentes que
transportaste e fizeste habitar nas cidades de Samaria não
sabem a maneira de servir
o deus da terra ;
por isso ,
enviou ele leões
para o meio
delas, os quais as matam, porque não
sabem como servir
o deus da terra .
Então , o rei
da Assíria mandou dizer :
Levai para lá
um dos sacerdotes
que de lá
trouxestes; que ele
vá, e lá habite, e lhes
ensine a maneira de servir
o deus da terra .
Foi, pois , um
dos sacerdotes que
haviam levado de Samaria, e habitou em Betel , e lhes ensinava como
deviam temer o Senhor . Porém cada nação fez ainda
os seus próprios
deuses nas cidades
em que
habitava, e os puseram nos santuários dos altos
que os samaritanos
tinham feito . Os de Babilônia fizeram
Sucote-Benote; os de Cuta fizeram Nergal; os de Hamate fizeram Asima; os aveus
fizeram Nibaz e Tartaque; e os sefarvitas queimavam seus
filhos a Adrameleque e a Anameleque, deuses de Sefarvaim. Mas
temiam também ao Senhor ;
dentre os do povo
constituíram sacerdotes dos lugares altos ,
os quais oficiavam a favor
deles nos santuários
dos altos . De maneira
que temiam o Senhor
e, ao mesmo tempo ,
serviam aos seus próprios
deuses , segundo
o costume das nações
dentre as quais
tinham sido transportados (...) . Assim ,
estas nações temiam o Senhor
e serviam as suas próprias imagens de escultura ;
como fizeram seus
pais , assim
fazem também seus
filhos e os filhos
de seus filhos ,
até ao dia
de hoje .
Percebe-se ainda
que esta intriga
agravou-se ainda mais
quando o Reino
do Sul foi levado
para Babilônia por
Nabucodonozor (605 a.C.), pois , com
a saída dos judeus
que habitavam Jerusalém, os samaritanos (agora
misturados a outras raças ) obtiveram imensa liberdade ,
que perdurou até
o surgimento de Ciro (539 a.C), quando este , ao
conquistar a Babilônia, permitiu que os Judeus e
seus sucessores
retornassem a Jerusalém (535-445 a.C.), com
ênfase na reconstrução
do Templo e dos muros
da cidade , fato
que causou certo
repúdio nas pessoas
de Sambalate, Tobias e Gesem. Pois, estes quiseram impedir
a reconstrução (Ne 4 e 6).
Foi o ressurgimento de Jerusalém como a cidade
do Grande Rei
(Adonai), que fez com
que a comunicação
com os “impuros ”
e caldeados samaritanos (na visão agora zelosa do novo judeu que
voltava do exílio ) diminuísse ainda mais , fato que
provocou uma multiplicação da imensa rivalidade
já existente.
Na tentativa
de melhor expormos esta disputa cultural, e a proporção
calamitosa que tomou, pouco poderíamos somar ao
comentário de Enéas Tognini (1980):
A Comunicação da Mensagem
1ºMomento: O Choque Cultural
A – Pregar é comunicar o Evangelho, não a nossa cultura!
O sol assumia sua
posição mais
imponente , o calor
por aquelas paragens
era exorbitante. Numa atitude
que denota perfeitamente
sua humanidade ,
Jesus, já próximo
de uma das cidades samaritanas chamada
Sicar, assentou-se junto à Fonte de Jacó para descansar .
“Nisto veio
uma mulher samaritana
tirar água .
Disse-lhe Jesus: dá-me de beber ”(V7).
O fato é que
Jesus estava prestes a trabalhar
o caráter daquela mulher
samaritana , ensinando-a que Ele é senhor sobre todos os povos ,
entretanto , simultaneamente, Ele queria a mesma
coisa para os seus discípulos ,
pois , era notório que
aquela barreira cultural também
os afligia e infelizmente concorria par a não comunicação
do Evangelho . Ora ,
isto Jesus nunca
permitiria, pois , não
importando as insólitas questões
culturais que separam os homens , o evangelho
jamais poderá sofrer
com isso ,
pois , ele é supracultural, urgente
a todos os povos .
E os discípulos , mas
do que ninguém precisavam entender
esta verdade ! (A continuação
veremos na parte 2)
B – O Choque cultural como fruto do etnocentrismo
Continuando, a barreira cultural a que me referi,
e que expressa
muito bem o ódio que se
nomeava entre aquelas duas culturas , fica patente
na declaração da orgulhosa
samaritana : “Como sendo tu judeu ,
pedes de beber a mim ,
que sou mulher
samaritana ?”(V9). Observe que ela faz pouco caso de
Jesus, e numa sentença rápida trata-o friamente
como um
“simples judeu ”.
O etnocentrismo
é justamente uma “visão do
mundo” onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os
outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos,
nossas definições do que é a existência. No plano intelectual, pode ser visto
como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, como sentimentos
de estranheza, medo, hostilidade, etc. Perguntar sobre o que é etnocentrismo é,
pois, indagar sobre um fenômeno onde se misturam tanto elementos intelectuais e
racionais quanto elementos emocionais e afetivos. No etnocentrismo, estes dois
planos do espírito humano – sentimento e pensamento – vão juntos compondo um
fenômeno não apenas fortemente arraigado na história das sociedades como também
facilmente encontrável no dia-a-dia das nossas vidas.
2º Momento: A Dificuldade na
Comunicação
A – A Autoridade
Necessária a Comunicação é Laboriosa
Estas palavras caíram como que um raio no coração daquela mulher ,
algo que
fica óbvio , observando-se sua resposta : “Senhor , tu não tens com que a tirar , e o poço é fundo ; onde , pois , tens a água viva ? És tu , porventura ,
maior que
Jacó, o nosso pai ,
que nos
deu o poço , do qual
ele mesmo
bebeu, e, bem assim ,
seus filhos ,
e seu gado ?”(V11-12).
A princípio ,
como tínhamos mencionado, aquela mulher referiu-se a Jesus apenas
como judeu
(iudo), entretanto ,
quando Jesus a olhou e disse que se ela ao menos soubesse do presente que estava prestes
a receber , e quem
era que
falava com ela ,
ela não
estaria naquele “pedestal ”, mas ,
estaria disposta a assumir
a posição de serva
e lhe pediria à água
que lhe
beneficiaria eternamente .
Ao ouvir isso
a mulher já
não responde de maneira
evasiva , mas ,
(mesmo surpresa
pelo fato de um homem , e este judeu , estar conversando com
ela ), por
causa da autoridade e amor com que Jesus lhe
respondeu, ela retruca, senhor
(kurios) tu
não tens com
que tirar –
a astúcia aqui
é algo impressionante ,
ela via em Jesus um homem diferente ,
porém , as experiências
passadas não
a permitiam uma confiança mais
fácil , e num tom
sobremodo sarcástico
indaga a Jesus a respeito de sua total “desprovidade de ferramentas ”
para lhe dar a água de que falara; lembrando-lhe ainda
do possível risco
em que
incorria ao, de certa forma ,
procurar se igualar a
Jacó, o idealizador daquele tanque .
B – Não Importa qual seja a Cultura, O Evangelho Denunciará o
Pecado
C – Para que haja
comunicação intercultural eficaz, é preciso que haja conhecimento cultural
prévio
Vejamos, era ora
sexta – como se diz aqui
no Nordeste “O Pingo
do Meio-Dia ” –, quando os raios solares
caem quase que
perpendicularmente ao continente , a hora
mais inóspita
de todas para um
serviço como
o que ela
estava desenvolvendo. Mas , por que ela estava ali ?
Com certeza ,
conforme tradição
cultural da época , sua
vida conjugal inadequada a separava do convívio comum com as demais mulheres , por isso , ela não vinha ao poço junto com as outras como
era comum
naquelas paragens (Champlin 2002), mas , sozinha ,
condoendo-se em seu
presente obtuso .
D – É o Evangelho quem Confronta o Ouvinte, não o Evangelista!
A mulher
pediu a Jesus a água da vida , com esta resposta Jesus começara a “cavar
o poço ”, ou
seja, trabalhar o seu
caráter , que
por sua
vez , se encontrava simbolizado no solo pedregoso do seu coração ! Com a expressão
cavar o poço
(para melhor compreensão ), perceba que
Jesus procurava abrir os olhos
da mulher para
sua real
situação (contextualização), não se tratava de supremacia
cultural, de um simples
capricho humano ,
mas do seu
futuro eterno .
A comunicação do evangelho
para salvação daquela mulher
sempre foi o objetivo
de Jesus em toda
esta conversa . Algo
que ficou muito
bem comunicado
nas palavras de Champlin (2002):
Jesus tocou na ferida de sua vida , expondo aos seus
olhos a culpa ,
e isso foi o primeiro
passo concreto
para cura de sua alma . Mediante um lance de olhos profético em sua vida privada tão vergonhosa , que
após cinco casamentos sucessivos
culminara em sua
atual relação
ilegítima , imediatamente
ele afetou a consciência
dela e desafiou a fé que ela deveria
depositar nele. A convicção
de pecado é a primeira
condição indispensável
para o perdão
e é mesmo o princípio
da conversa .
Jesus, em momento
algum perdeu tempo
com comunicação
de cultura (Lausanne 1978), a despeito das investidas
preconceituosas da mulher , mas , preocupou-se em
comunicar o evangelho
de maneira pertinente
e significativa . Em
parâmetros culturais que fizessem sentido
aquela mulher , que
a fizessem compreender a profundidade
da mensagem , conforme
continuaremos a ver .
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