domingo, 7 de fevereiro de 2010

OBELISCOS, APENAS ARTE?


Símbolo de beleza e ostentação, ou apenas uma cicatriz no rosto de algumas cidades? Essas são algumas das perguntas que elaboramos ao contemplarmos os famosos Obeliscos.

Do latim obeliscus, trata-se de um monumento comemorativo, típico do Antigo Egito (ou da Babilônia?), constituído de um pilar de pedra em forma quadrangular alongada e sutil, que se afunila ligeiramente em direção a sua parte mais alta, podendo (ou não) ser decorado com inscrições hieroglíficas gravadas nos quatro lados, terminando com um ponto piramidal (fálico).

Os mais antigos obeliscos eram feitos a partir de apenas uma única peça de pedra monólitos. Todavia, tem-se relatos de outras culturas que mesmo separadas por dezenas de quilometros dos egipcios (como os povos do oriente com seus zigurates), também tinham como costume a prática de se construir tais “monumentos”. Entretanto, devido as diferenças históricas no decurso do desenvolvimento de cada cultura, essas peças, embora possuissem o mesmo objetivo (para uns um meio para o céu, para outros um observatório), não eram elaboradas a quiescência egipcia. O que se percebe, é que mesmo diferindo uns dos outros no que diz respeito ao material de que foram produzidos, tais elevações influênciaram indelevelmente as cultras a que pertenceram. Mas, porque? É está pergunta que vamos procurar responder.

In Ilo tempore, fixar uma Cruz num território conquistado equivalia a consagração da região (abordagem a partir da história da religião), e de certo modo, a um novo nascimento, pois, com esta atitude, a terra conquistada recentemente era “renovada”, “recriada” pela Cruz (fenomenologicamente). Este processo religioso encerrava em si um Ato Cosmológico, uma vez que, o sagrado possui a característica de revelar a realidade absoluta e ao mesmo tempo, torna possível a orientação – portanto, funda o mundo, no sentido de que fixa os limites e, assim, estabelece a ordem cósmica. Todo local que ainda se encontra desconhecido, estrangeiro, ou desocupado (muitas vezes desocupado por “um dos nossos”) ainda encontra-se no caos.

É justamente a premissa de solucionar a instauração do caos que funda o mundo, o surgimento do espaço organizado, Cosmos, implica sempre uma irrupção do sagrado que tem como resultado dastacar um território do meio amorfo que o envole e o torna qualitativamente diferente. É a presença do sagrado que traz pertinência a existência e transforma o Caos em Cosmos.

Geralmente, o espaço habitado que hoje é ocupado por boa parte das culturas ao redor do mundo, foi instaurado num tempo mítico, pelos ancestrais de cada povo respectivamente. Desta forma (conforme as tradiçoções), para se manter na presença sagrada que foi instituida por este ancestral e que delimita o limiar entre o espaço sagrado (ocupado pelo povo) e o profano (onde ainda impera o caos) é necessário algo que delimite exatamente esta esfera de atuação, e que faça uma plena distinção (limiar) entre o mundo fundado e o desorganizado.

Estar no local exato é vital para manutenção da vida, pois, uma vez perdido o contato com o mundo criado, perde-se também o contato com o deus protetor, o que acarretaria (espiritualmente/culturalmente dependendo-se da crença) o fim do mundo. Cada hierofania representa o centro do mundo ontologicamente, assim, perder-se deste território acarretaria, portanto, uma total falta de orientação, o ressurgimento do caos, da relatividade e do amorfo. Com a perda do “Ponto Fixo” absoluto, o homem deixaria de viver no “Centro do Mundo”, onde deus habita e assim estaria sozinho.

Para impedir que tal desgraça aconteça (para estas culturas), é que entra em cena o Obelisco. Pois, ele possui a finalidade de funcionar como o limiar (ponto-base), é ele quem demarca o local e propcia a continuidade do espaço, pois tudo o que está a sua volta torna-se consagrado, daí sua grande importancia religiosa, pois, ele é o simbolo e ao mesmo tempo o veículo de passagem para o mundo dos deuses. Para os povos destas culturas, é o obelisco quem propicia o contato entre os homens e o céu.

Esta característica cultural fica bastante clara quando se avalia circunspecticamente seus povos. Por exemplo, observando-se as tradiçoes dos Achilpa, uma tribo Arunta, percebemos que o ser divino Numbakula (seu ancestral mítico), cosmizou nos tempos míticos as terras por eles acupadas e fundou, com este rito, o seus territórios. Os Arunta acreditam que de uma “árvore da goma”, Numbakula moldou o poste sagrado (espécie de Obelísco de madeira), e despois de tê-lo ungido com sangue, trepou nele e desapareceu no céu. Desde então, este poste representa o eixo cósmico que delimita o espaço dos Achilpa, pois, foi à volta dele que o território se tornou habitável. Por causa disso, durante suas peregrinações, os Achilpa transportam-no sempre consigo e escolhem a direçõa que devem seguir em suas peregrinações de acordo com a inclinação do poste. Isto permite que os Achilpa estejam sempre no “seu mundo” e, ao mesmo tempo, em comunicação com o céu, onde Numbakula desapareceu. Se o poste se quebra, é uma catastrofe, é de certa forma, o “fim do mundo”.

Para os Kwakiutl, seu “Poste de Cobre” atravessa os três níveis cósmicos (o mundo de baixo, a terra, e o céu), no ponto onde o poste toca o céu, encontra-se a porta do mundo do alto. O Axis mundi que se vê no céu (Via Láctea), torna-se presente na vida (culto) do povo, pela obra dos deuses na forma de um “poste sagrado”. Na cultura Kwakiutl, este monumento é composto por um tronco de cedro de dez a doze metros de comprimento. Esse pilar desempenha um papel capital nas cerimônias, pois, para este povo, é ele que confere uma estrutura cósmica ao rito (casa). A casa dos Kwakiutl, pela intervenção cultual do poste, torna-se o centro do mundo.

Depreende-se, através deste breve esplanação, que para estas culturas os três níveis cósmicos (inferno, terra e céu) interagem através desta “Coluna Universal”, Axis Mundi, que sustenta o Céu e a Terra, e cuja base se encontra cravada no mundo de baixo, inferos. Esta coluna cósmica só pode situar-se no próprio centro do universo, pois a totalidade do mundo habitável espalha-se a volta dela. É a presença do Obelísco (poste sagrado) que organiza o espaço a sua volta e define o comportamente religioso destes povos. Perceba, que é este ínfimo objeto que culturalmente faz a ligação (simbolicamente) entre o homem (nativo) e o seu deus (mítico). Oxalá, eles ao menos ouvissem a respeito do Verdadeiro Caminho, expressado pela mais poderosa Verdade que inevitavelmente produz a mais abundante Vida. Mas, como ouvirão se não há quem pregue? Enfim...

Deixando o contexto cultural de lado, uma vez compreendido insofismavelmente a forma como estes objetos são edificados, é de causar um imenso pesar o fato de se refletir a cerca de culturas tão piedosas, que procuram incesantemente uma solução para o caos em que vivem, e que se “contentam” (por falta de alternativas?)em habitar uma área pseudo-santificada por um poste-monumento, quando na realidade, eles ainda não sabem de onde vieram, onde estão, e nem para onde vão. Como podem viver assim a deriva?

Acredito que é tempo de saltarmos no meio destes povos, vestes rasgadas, gritando a plenos pulmões:

Varões, por que fazeis essas coisas? Nós, também, somos homens como vós, sujeitos às mesmas paixões, e vos anunciamos que vos convertais dessas vaidades, ao Deus vivo, que fez o céu, e a terra, e o mar, e tudo quanto há neles;
O qual, nos tempos passados, deixou andar todas as gentes em seus próprios caminhos.
E, contudo, não se deixou a si mesmo sem testemunho, beneficiando-vos lá do céu, dando-vos chuvas e tempos frutíferos, enchendo de mantimento e de alegria os vossos corações.

Trazendo em fim a verdadeira“Solução para o Caos!

Mas, para alguns, obeliscos continuaram sendo apenas arte...