quarta-feira, 22 de junho de 2011

MAIS UM FIM DE PERÍODO (2011.1)

Olá queridos teólogos, Graça e Paz!

Pois é amados, mais um período chegou ao fim; e com ele, uma série de expectativas. Fim de período é sem sombra de dúvida um período de "descobrimento". Alguns descobriram, para sua própria perplexidade, que não tinham o "chamado" que achavam ter recebido. Outros, descobriram surpresos, que fazer teologia não é tão fácil - como alguns asseveravam. E finalmente, mesmo que em menor número, alguns perceberam que fazer (estudar, produzir, pensar) teologia é a maior benesse intelecual/espiritual que um servo pode receber.

Para estes, que no pensar de Spurgeon são semelhantes a Sansões espirituais, teço algumas considerações. A princípio, gostaria de congratulá-los por mais esta conquista, de fato, nestes tempos pragmáticos, não é nada fácil abdicar de uma universidade ou seja lá de quê (desculpem os termos...), para ingressar num seminário teológico. Isto, por conta de alguns obstáculos que enumero como os percebo. Primeiro, tem-se que vencer os próprios familiares, os quais só querem o "nosso bem" e nos aconselham a primeiro se formar (em qualquer coisa, menos teologia), constituir família, estabilizar-se financeiramente, esperar os filhos se equilibrarem e só então assumir a cátedra. Segundo, tem-se que vencer a si mesmo, a falta de motivação, de concistência, os inúmeros "problemas pessoais" [...]. Terceiro, tem-se que vencer a terrível falta de recuros para quem se aventura nestas paragens - é impressionante como a igreja local sempre está com "outros projetos" em andamento. Em fim, aos que concluíram - parabéns!

Espero, em nome de Jesus, vê-los no próximo período. Oro por isso.

Que nestas férias, nada pareça mais valioso que a cruz ensanguentada - que eles não vejam nada além da cruz. Que para eles, o evangelho nunca perca o fulgor, que em qualquer lugar, seja onde for, que ele sempre se mostre supracultural.

Que eles possam continuar buscando a supremacia de Cristo sobre todas as coisas, para alegria de todos os povos. E que estejam dispostos a dar suas vidas por isso.

E que, em meio, talvez, aos mesmos problemas, o Senhor me conceda forças para no próximo período abrir a porta daquelas salas - uma vez mais, e dizer - então, são vocês?

Fim de período... parabéns a todos nós. Glória apenas a Deus.   

sexta-feira, 17 de junho de 2011

O MITO DO ETERNO RETORNO

De autoria do conspícuo historiador das religiões, Mircea Eliade (1907-1986), o livro O Mito do Eterno Retorno - Ed. Mercuryo; que, também, poderia se chamar Introdução a uma Filosofia da História; trata da complexidade que orbita o tempo cíclico (mitológico, sagrado) e o linear (atemporal, cristão). Toda a problemática do livro é de valor inestimável para a história e consequentemente para fenomenologia da religião.

A princípio, o autor se preocupa em dirimir de maneira sucinta qual o objeto de sua pesquisa, quiçá, o significado e função daquilo que chamamos de "arquétipos e repetições". Mircea procura demonstrar que a "história" é fomentada por meio de mitos que explicam a evolução do homem; ele diz "os mitos preservam e transmitem os paradigmas, os modelos exemplares, para todas as atividades responsáveis a que o homem se dedica. Em razão desses modelos paradigmáticos, revelados aos homens em tempos míticos, o cosmo e a sociedade são regenerados de maneira periódica", grosso modo, os mitos fazem com que o homem "pertença" a história - a qual, no pensamento de Eliade é em sua maioria cíclica.

Definido o entendimento de arquétipos (exemplos de início), temos o simbolismo do centro, que na perspectiva do autor denota ao homem a capacidade de fundar o mundo a partir da repetição do Ato Cosmogônico. Esta recriação remonta o homem ao ilud tempus, o tempo forte - mítico. Segundo Eliade, o tempo do começo, da criação, é o tempo que os rituais cosmogônicos procuram restaurar, por se tratar do tempo vivido pelos heróis ancetrais que fundaram o mundo, e, consequentemente as tribos e povos que o remontam. Ainda segundo Eliade, os mitos cosmogônicos iniciam ou aparelham os povos para a realidade temporal que os espera, amalgamando-os aos seus heróis. Para este corifeu da história da religião a história do homem é contada por sua forma de conceber o sagrado, o qual esta sempre se repetindo no "rememorar" do mito.

Destarte, esta regeneração do tempo, fruto da rememoração do ilud tempus, é concebida por meio do entendimento do ano, do ano novo e finalmente pela periodicidade da criação. Segundo Eliade, o tempo esta sempre se regenerando; sempre que qualquer ritual é celebrado, para que o mesmo venha ter relevância sagrada, ele precisa remontar ao princípio, ao tempo em que foi pensado pelo herói ou ancestral mitológico. São inúmeros os mitos que regeneram a criação, os quais, não serão objetos deste artigo por conta do formato (tamanho) pensado para o mesmo. Entretanto, por seu "infinito retorno" o entendimento de história, conforme pensado por nós (ocidentais principalmente), é prejudicado pela eterna recriação do tempo passado. Fato que fez com que Claude Levy-Strauss (1908-2009) asseverasse que não existia história (num outro contexto, lógico) e sim o reviver de um mesmo ocorrido.

Ato contínuo, toda esta problemática é degringolada no terceiro capítulo do livro; o qual desenvolve toda a poderosa relação que o irrupmento do sagrado (hierofania) amealha a vida dos indivíduos impingidos. A contagem do tempo inter-povos descreve a maneira como os mesmos concebem sua existência, a mesma varia desde uma simples referência lunar, até o mitológico ciclo cósmico que traduz a sede do imanente que caracteriza os povos de per si. Todo o argumento de Eliade ambiciona preparar os leitores para a caracterização cíclica que denotam o interesse dos povos de não deixaram a "fonte" que os tornam o que são - suas raízes mitológicas (axis mundi). A única exceção ao pensamento do autor no que tange ao mito hora exposto é o cristianismo. A religião cristã, em seu forte teor escatológico, "rompe" com a perspectiva cíclica dos povos pesquisados e cria uma dobra no pensamento de Eliade. Esta execeção à regra tem gérmen no próprio entendimento de Reino de Deus pensado por Jesus. O Reino pregado por Cristo estaria incontinente dentro de seus seguidores e se concretizaria no futuro próximo. Tal teologia perde toda a conotação cíclica que, até então, caracterizava o pensamento sagrado; e passa a se basear numa concepção "linear". O cristianismo, portanto, não se coaduna com o eterno retorno pensado por Mircea Eliade, e, grosso modo, torna-se o ponto alto de seu pensamento no livro em tela.

No quarto e último capítulo, Eliade reitera a concepção ahistórica do homem arcaico e assevera a postura que havia aventado no capítulo anterior sobre a reconstrução da história pelo homem moderno (cristão). Segundo ele, a singularidade do historicismo se arrima na capacidade que o homem moderno possui de agrilhoar um pensamento linear relevante a posteridade. Toda a liberalidade do pensamento moderno lhe valoriza o apego a verdades diuturnamente relativizadas por seus pares, fato que foi indistintamente trabalhado por Eliade no tomo "dificuldades do historicismo". Não obstante, tal apego ao cristianismo "liberta" o homem do eterno ciclo que lhe manieta, fato que nas palavras de Eliade "liberta o homem da história", o mesmo assevera, "a fé, neste contexto, assim como em muitos outros, significa a emancipação absoluta de qualquer tipo de "lei" natural, e, portanto, a mais elevada liberdade que o homem pode imaginar: a liberdade de poder intervir até mesmo na reconstrução ontológica do universo. Em consequência, trata-se de uma liberdade preeminentimente criativa. Em outras palavras, constitui uma nova fórmula para a colaboração do homem com a criação - a primeira, mas também a única fórmula a ele concedida desde que o tradicional horizonte dos arquétipos e repetição foi ultrapassado. Apenas uma tal liberdade é capaz de defender o homem moderno do terror da história - uma liberdade, em outras palavras, que tem sua fonte e encontra sua garantia e apoio em Deus". Nestes termos, Mircea Eliade valoriza a fé cristã, pois, sua peculiaridade em conceber uma nova realidade, liberta o homem do "eterno retorno" (história) que o aprisiona.

Finalmente, percebo neste ditoso livro a mais profunda definição do pensamento deste que, na opinião de boa parte da academia, é uma das maiores autorides em mitologia de todos os tempos. Integrante do Círculo de Eranos e um dos mais renomados professores de história da religião, Eliade é indispensável para leitura hodierna do fenômeno religioso. No meu entender, o Mito do Eterno Retorno é a principal obra deste homem brilhante. Indico a leitura deste manual de história da religião a todos quanto almejem entender os bastidores do pensamento religioso arcaico e moderno. Trata-se de um clássico!

ELIADE, Mircea O Mito do Eterno Retorno, Ed. Mercuryo - São Paulo, 1992.